domingo, 31 de janeiro de 2010

Carvalho Brasileiro


Este texto fiz para a mangueira lá de casa, que está morrendo e será cortada. Leiam isso daí, já já retorno ao ritmo das postagens...

21 nov 10.

"Querida Mangueira, carvalho brasileiro, sustento de quilombolas e elo entre um homem e seu umbigo.

Há quase um século Sebastião te plantou, veio parar neste Rio de novos janeiros fugindo da seca e hoje tuas raízes fortes me cobram esforço para lembrar que até você já foi fruto frágil.

Seu tronco largo me remete a tardes claras de almoços familiares, sorriso frouxo e celeuma de crianças. Eu era uma delas a recostar minha espinha magra em ti. Teus galhos imponentes aos céus foram leais escadas para os meus sonhos e tua folhagem, sombra para meus devaneios. Teus frutos, doces motivos para se viver e espada para crescer justo e leal como Sebastião. Eu não sei se eram mangas ou espadas...

Já fixei inimigos em tua coluna e esmurrei tua casca, já alinhei minha pontaria te fazendo alvo... e tu chorava viscosa seiva no entorno do aço. Quando donzel tu me confidenciou que na sua copa mora o anjo que faz ventar; na era da razão lia de Sabino a Hesse sob tua sombra mosaica.

Até que eu também me fiz árvore e gerei um fruto para esta terra, a ela também você nutriu, e neste dia professei solene: “Prova, é manga e é espada”. Sou eternamente grato.

Neste ramo da árvore do Agora, tal qual folha frágil, tu serás lançada ao solo. Adoeces e com tua madeira range meu coração. O fim chega para todos e seu eterno inverno é próximo. Entre os antigos é dito que nem toda madeira é para o trabalho do mercúrio, a tua eu sei que é. Arde em paz e perdoa meus golpes, mas conta também das minhas carícias ao fogo.

Teu sumo corre em meu sangue, como correu no de meu avô e se apressa em inundar de virtude o frágil corpo de minha filha.

Querida mangueira, um doce e verde Adeus".